domingo, 5 de fevereiro de 2017

Eu, ela e ela mesma

Conheci duas garotas.

A primeira é uma princesa, delicada e meiga. A segunda é uma guerreira, forte e sensual.

Uma sonha com o amor, a outra vive a aventura.

Uma me trouxe paz e carinho, enquanto a outra me roubava o sono.

Elas não se conheciam. Mas estiveram sempre juntas. Seus caminhos foram traçados antes mesmo que elas pudessem escolher. Por mais distantes que elas fossem, uma não vive sem a outra. Por mais que suas visões de mundo sejam diferentes, no fundo elas compartilham os mesmos desejos. Cada uma, do seu jeito, quer apenas dar um sentido para esta vida.

Uma tenta dar sentido a sua vida com o amor. O amor que pareceu estar distante. O amor que deveria estar sempre ao seu lado, mas que lhe escapou a vida inteira. Mas mesmo quando o mundo lhe negou o afeto, ainda assim, ela tentou justificar amando por sí só e pelo mundo todo. E segurando com todas suas forças a mais exuberante rosa azul. Em espinhos, viu suas mãos sangrarem vermelho.

A outra dá sentindo a sua vida, mesmo sem tentar, se aventurando por lugares diferentes, sem medo do que pode encontrar, pois acha que ela mesma já se perdeu. Assim conheceu várias pessoas, mas nunca deixou que ninguém a conhecesse. Tocou vários rostos, mas sua face nunca foi tocada. Nunca satisfeita, procurou satisfazer os desejos dos outros, e assim encontrou sua paz. Diz não ter sentimentos, ser fria e indiferente. E por isto não reconhece o ódio que a move para frente. 

Muitas vezes vagamos pelo mundo como se estivéssemos sozinhos. Vemos as outras pessoas sorrirem, se divertirem e interessadas por coisas, que não despertam emoções alguma em nós. Mas tudo isto muda, quando conhecemos alguém que consegue se conectar com nossa alma.

Na primeira eu encontrei o amor.

E minha alma foi desnudada pelo seu olhar, foi acariciada pelo seu toque e dançou com a melodia da sua voz. Juntos, caminhamos por este mesmo mundo, mas agora ele era um imenso jardim florido, com uma fragrância que nos enamorava. E a noite vinha, e nesta hora as estrelas eram nossas cúmplices, que em silêncio, eram as únicas que podiam ouvir nossos suspiros. Juntos, desvendamos o que a noite pode nos dar de melhor. E nossos corpos se entrelaçaram em carinho e prazer.

Mas o Sol teimava em vir depressa. Era o resto do mundo que clamava por nós. E dez mil anos seriam pouco. Vivemos não uma, mas muitas eternidades juntos. Mas mesmo assim, foi pouco. E em seus braços eu chorei de saudade de tudo aquilo que jamais teríamos tempo de viver.

Na segunda eu encontrei o prazer.

Seu fogo aqueceu nossas noites, e junto derreteu as geleiras do meu coração. Nossos corpos ardiam no prazer, e juntos nos aprofundamos no desejo e na paixão. E quanto maior a satisfação do outro, maior a nossa entrega. E quanto maior a nossa entrega, mais satisfação nós mesmos encontrávamos. E todas nossas incertezas acabaram enquanto juntos nos deliciávamos com nosso próprio prazer. Seu corpo era incrível, mas foi sua alma que me encantou. Seu beijo era maravilhoso, mas foi seu sorriso que me enfeitiçou. E por um pequeno instante ela estremeceu em medo e junto de um prazer que jamais sentiu, pois não era só um corpo, mas uma alma que encantava a pessoa a sua frente. 

A sede do seu corpo era insaciável, mas sua mente parecia já estar satisfeita. Ela era confiante e suas certezas ofuscavam minhas dúvidas. Se dizia feliz, tinha tudo que queria e ainda podia dar muito mais ao mundo, mesmo achando que este não mereceria. Não tinha preocupação com a morte, e não se importava com o que iria acontecer, pois beijaria a morte se ela chegasse aqui e agora. Eu, deslumbrando, tinha muito o que falar e o que ouvir, mas ela não tinha tempo a perder. 

Elas estavam juntas, e dependiam uma da outra. Quando uma não tinha forças para enfrentar o mundo, era a outra que o encarava. Mas nem só de batalhas se pode viver, e quando o mundo se mostrava irritantemente invencível, era a outra que o aturava. Juntas elas são melhores que qualquer outra, e por isso me sinto privilegiado de ter tido um pouco com elas.

E foi assim, o que eu queria nunca importou. E enquanto uma me queria, mais que ao mundo inteiro. A outra tinha o mundo inteiro, mas não queria nada.